Habitat for Humanity: construção mais rápida e econômica com impressão 3D
- Em Tempe, no Arizona (EUA), a Habitat for Humanity criou, pela primeira vez, o protótipo de uma casa impressa em 3D.
- Essa tecnologia tem o potencial de proporcionar maior rapidez na construção e reduzir os custos de mão de obra e o desperdício de material.
- A tecnologia inovadora do projeto também pode atrair possíveis voluntários e investidores.
Enfrentando o calor abrasador – mais de 43 graus em Tempe, no Arizona –, a impressora 3D de construção da Habitat for Humanity depositou dia após dia, com grande esforço, as camadas de argamassa que formariam a primeira casa impressa em 3D dessa organização sem fins lucrativos: uma estrutura unifamiliar de três quartos com uma área de 11 x 21 x 7 metros e um espaço total habitável de 159 metros quadrados.
Esse projeto vai ajudar a determinar a viabilidade da impressão 3D de casas populares. “Esperamos contribuir com a base de conhecimento que está sendo trazida para este projeto”, comenta Jason Barlow, presidente e CEO da Habitat for Humanity Central Arizona. “Um dia talvez isso se torne uma prática comercial normal: você pegará uma impressora e imprimirá a sua própria casa.”
A onda de calor gerou condições desfavoráveis para todo tipo de construção e impôs desafios adicionais à operação da impressora 3D de construção COBOD BOD2 . A mistura da argamassa e a velocidade de impressão precisavam ser adequadas às condições climáticas, explica Samuel Hager, engenheiro de aplicação e líder de projeto da Peri USA, a empresa que forneceu a impressora BOD2, o material e os arquivos de impressão, além da experiência. Se a equipe fosse rápida demais ou produzisse uma mistura muito líquida, a parede despencaria. Se a equipe fosse lenta demais, não haveria boa aderência entre as camadas. Temperaturas abaixo de zero também dificultam o bombeamento da mistura.
Apesar dos desafios, a impressão foi concluída em meados de junho de 2021. Estava tudo pronto para que os voluntários da Habitat e futuros proprietários pudessem, então, construir o telhado convencional, instalar o piso, as portas e os armários e pintar a casa. Embora seja possível aplainar as paredes durante a impressão, as paredes internas e externas da casa da Habitat serão mantidas com as camadas onduladas da impressão.
Inovação em casas populares
“A proposta da Habitat é habitação acessível e digna para quem precisa”, explica Barlow. “Principalmente devido à situação atual do mercado nessa área, estamos sempre buscando alternativas melhores e inovadoras para a construção de casas.”
Chegamos a considerar a possibilidade de usar blocos de terra compactada, polímeros de garrafas plásticas recicladas e blocos de cânhamo. Há cerca de 19 meses, Clarence McAllister, um dos diretores da 3D Construction, apresentou a Barlow uma proposta para uso do processo aditivo da Peri.
A Habitat já havia conseguido o local e tinha as plantas aprovadas pela prefeitura para a construção de uma residência pelo método convencional. Solicitou, então, à Candelaria Design Associates que modificasse as plantas de modo que funcionassem com a tecnologia de impressão. A Candelaria é especializada em casas personalizadas. O diretor, Mark Candelaria, que também faz parte da diretoria da Habitat, cedeu a experiência da empresa para o projeto.
Uma casa entre o convencional e o não‑convencional
Graças à doação dos materiais, da experiência e do uso da impressora BOD2 e ao terreno, esse projeto da Habitat funcionou como protótipo e experiência de aprendizado para todos.
Trabalhando em conjunto com a Peri, a Candelaria carregou os arquivos existentes do Autodesk AutoCAD no Autodesk Fusion 360 para remover dados de BIM (Modelagem de Informações da Construção) e criar um arquivo que direcionasse o caminho da impressora à medida que fosse depositando as paredes, com toques finais fornecidos pela Peri. Era fundamental fazer tudo certo: “Depois que você imprime, está feito”, explica Damon Wake, diretor de equipe e gerente de projeto da Candelaria.
Um empecilho eram os códigos de construção da impressão 3D: o Código Internacional de Construção (IBC) ainda não contempla esse tipo de construção. “Foi difícil criar uma estrutura que pudesse ser aprovada”, revela Wake. “Tivemos várias conversas pelo Zoom com os funcionários da prefeitura de Tempe.”
Por exemplo, a impressora produz um par de paredes paralelas de 5 cm com um espaço entre elas. Mas a Candelaria não tinha autorização para usar esse tipo de parede para sustentar o telhado. Por isso, introduziu pilares de concreto armado na cavidade da parede para sustentar as vigas laminadas coladas. O engenheiro estrutural também solicitou reforço para a junta horizontal.
Com base nessa experiência, Wake acredita que teria sido mais rápido e econômico usar armação convencional e drywall nas paredes internas não estruturais. Ele também chama atenção para o fato de que a superfície irregular das paredes internas dificulta a instalação de armários.
“Não basta ter rapidez na impressão, é necessário proporcionar agilidade a todos”, comenta Wake. “É preciso identificar os pontos fortes e os pontos fracos dessa tecnologia para torná-la útil no setor de construção civil.”
Análise de custo/benefício: as vantagens das casas impressas em 3D
Os defensores da construção com impressão 3D afirmam que a tecnologia pode proporcionar uma construção mais rápida e reduzir os custos de mão de obra e o desperdício de material. Além disso, com o uso de massa de concreto, as estruturas consomem menos energia e são mais resistentes a terremotos e condições climáticas adversas. A disparada dos preços da madeira serrada e a escassez de mão de obra qualificada tornam a impressão 3D ainda mais atraente.
Segundo a CNN, a SQ4D afirma que a construção da casa de Riverhead, em Nova York, vendida recentemente foi 50% mais econômica e 10 vezes mais rápida do que uma construção convencional. A Mighty Buildings vende casas pré-impressas e modulares com painéis impressos e garante que o processo adotado pela empresa elimina 95% do desperdício. O Palari Group pretende construir uma comunidade de 15 casas em Rancho Mirage, na Califórnia, em parceria com a Mighty, e prevê uma redução do tempo de construção de 50%.
A New Story, uma construtora de habitações populares para comunidades carentes, construiu um projeto de demonstração em Austin, no Texas, em 2019. A construtora estima que a tecnologia possibilitará uma economia de US$ 2.500 por residência.
Impressão 3D de casas populares: uma nova tendência para o futuro?
A Habitat só vai poder calcular o custo total do projeto depois que a construção for concluída. Mesmo assim, por se tratar de um método de construção totalmente novo, é difícil fazer uma comparação com a construção tradicional.
“Todos os projetos que você vê hoje são protótipos”, observa McAllister, da 3D Construction. “Se podemos ou não ser competitivos, isso ainda vamos descobrir.”
Hager, da Peri, observa que o projeto da Habitat será competitivo em relação à construção convencional padrão com estrutura em madeira – e que os futuros projetos serão ainda mais econômicos. “A oportunidade para redução de custos é grande, e sabemos que é possível obter maior rapidez com menos pessoas”, explica. “Em condições favoráveis, isso significa um dia para entregar e configurar a impressora. Acreditamos que duas semanas depois já poderemos pegar nossas coisas e voltar para casa.”
Em geral, a construção de uma casa da Habitat requer 25 a 30 voluntários e leva algumas semanas para ser concluída. No entanto, Hager observa que a impressora BOD2 exige apenas duas pessoas: uma no computador ajustando a velocidade de impressão e outra na bomba verificando a qualidade do material. Sendo assim, em vez de mobilizar 25 pessoas para construir uma casa, Hager sugere que “A Habitat pode alocar duas pessoas, uma bomba e uma impressora e fazer o mesmo trabalho em um prazo igual ou menor”.
“Isso pode ser um divisor de águas para as casas populares – e qualquer outro tipo de habitação – se conseguimos reduzir de forma significativa o custo e o tempo da construção”, prevê Barlow, da Habitat. “E vai se tornar mais acessível para nós quando for possível imprimir ao mesmo tempo umas cinco residências urbanas geminadas de dois andares.”
Wake acrescenta que o projeto gerou muita empolgação e atraiu a atenção do público por ser algo novo. “Do ponto de vista de um designer, ainda há um longo caminho a percorrer para torná-lo eficaz… e garantir que seja uma alternativa melhor”, observa. “Queremos ter certeza de que não estamos fazendo isso somente por ser uma novidade, mas porque produz algo que não é possível obter com outra técnica de construção.”
Ainda há outro aspecto inestimável do projeto: a organização está sempre buscando novos patrocinadores e voluntários, e Barlow espera que isso desperte o interesse de pessoas do setor de tecnologia que ainda não prestaram muita atenção à Habitat.
“Foi um excelente laboratório”, comenta. “Talvez abra uma porta.”