Como tecnologias de gestão inteligente da água ajudam na crise hídrica
No mundo todo, há lugares ficando sem água. Grandes áreas da África do Sul, Brasil, Índia e Austrália – um total de 17 países, que representam um quarto da população mundial – enfrentam um estresse hídrico “extremamente elevado”. A população crescente, o aumento da urbanização e as mudanças climáticas estão colocando a crise hídrica entre os cinco principais riscos globais, ano após ano, desde 2012, segundo um relatório do Fórum Econômico Mundial.
Está cada vez mais claro que as concessionárias de água precisam repensar a forma como planejam e mantêm sua infraestrutura hídrica. Muitas estão adotando a gestão digital da água – uma transformação digital rumo a tecnologias de gestão inteligente da água, que variam de soluções de Big Data ao gerenciamento avançado de redes de distribuição.
A Black & Veatch de Overland Park, no estado norte-americano do Kansas, é uma das principais defensoras de estratégias digitais para gestão da água. Fundada em 1915, a empresa de consultoria em engenharia e construção é especializada no desenvolvimento de infraestrutura para água e outros mercados. A empresa oferece suporte para todos os aspectos do setor de água, auxiliando os clientes na coleta, armazenamento e tratamento de água e esgoto, no planejamento e gestão de bacias hidrográficas, no aproveitamento da energia do tratamento de água e na melhora da sustentabilidade.
A Black & Veatch integra dados de sensores de vários sistemas de infraestrutura das estações em uma única versão da “verdade” e, em seguida, aplica análises e inteligência artificial a fim de melhorar as operações de água, garantir mais sustentabilidade e controlar custos.
“A gestão digital da água nos permite analisar a infraestrutura como um todo, não apenas os ativos individuais”, diz Michael Etheridge, engenheiro-chefe do Water Group da Black & Veatch. “À medida que os dados se tornam mais integrados, os operadores das estações conseguem entender melhor as relações entre os conjuntos de dados. Esse processo ajuda a identificar a correlação e a causalidade entre aspectos de um sistema que os humanos não conseguem identificar com facilidade, permitindo otimizar as operações. Também podemos usar os dados como parte de um sistema integrado de simulação que mostra o impacto das nossas decisões antes que sejam implementadas.”
Otimização da eficiência de estações
A Black & Veatch está construindo uma nova unidade de recuperação de água em Morro Bay, na Califórnia, para substituir a antiga estação de tratamento de esgoto dessa cidade litorânea. A nova unidade ajudará a cidade a abandonar a descarga de esgoto tratado no oceano e a criar um novo recurso hídrico local e sustentável. Com capacidade para atender até 80% das necessidades hídricas de Morro Bay, a estação incluirá processos avançados de tratamento, possibilitando o uso de água tratada para reabastecer o suprimento de água subterrânea e, ao mesmo tempo, manter a conformidade com regulamentações rigorosas.
Na maioria das estações, o tratamento de esgoto começa quando a água flui dos esgotos e das galerias de água pluvial para uma unidade de pré-tratamento, onde é filtrada para remoção de pedras e outras substâncias inorgânicas. Produtos químicos e a gravidade precipitam partículas sólidas em suspensão, que são retiradas por bombeamento e processadas separadamente. A água restante flui para uma estação de tratamento biológico que retira, por meio de aeração, os nutrientes relacionados ao fósforo e nitrogênio. Pode haver processos complementares de sedimentação ou filtragem para retirada de outras partículas sólidas em suspensão.
Dependendo dos requisitos regulatórios, em seguida a água pode ser clorada ou desinfetada por UV e, então, lançada em um rio ou usada para serviços não potáveis, como irrigação de campos de golfe. Em Morro Bay, processos complementares de filtragem e tratamento tornarão a água adequada para uso potável indireto, em que a água tratada é devolvida ao ciclo hidrológico por injeção em águas subterrâneas ou é bombeada até uma estação de tratamento de água para que chegue aos níveis de qualidade da água potável.
Há muito tempo as estações já utilizam a automação para otimizar esses processos de tratamento de água, eliminando a coleta manual de dados. Sensores de pressão, medidores de vazão e outros dispositivos (usados para medir cloro, pH residual na água e outras características) alimentam sistemas automatizados de controle da estação que ligam e desligam bombas, fazem a retrolavagem de filtros e ajustam as taxas de alimentação de produtos químicos. Os conceitos de gestão digital da água ampliam o uso desses dados para integrá-los a informações operacionais relacionadas e algoritmos de otimização a fim de oferecer suporte a operações aprimoradas, tanto da perspectiva da qualidade quanto de custos.
Usando uma tecnologia de aprendizado de máquina baseada em nuvem chamada ASSET360 (desenvolvida pela Atonix Digital, subsidiária da Black & Veatch), “os operadores poderão identificar anomalias na operação com mais rapidez”, diz Michael Etheridge. “Também poderão encontrar correlações menos óbvias que talvez levem a otimizações operacionais. Por exemplo: os operadores sabem que a temperatura influencia o tratamento de esgoto, mas o aprendizado de máquina pode informar que, quando a temperatura da água estiver abaixo de 10° C, o uso de um determinado produto químico em maior quantidade poderá prolongar o período até que um filtro precise de limpeza, diminuindo a mão de obra e outros custos.”
Melhor integração e compartilhamento de dados
Como projetista da nova estação de Morro Bay, a Black & Veatch está ajudando a aumentar a eficiência operacional e de manutenção do projeto e a diminuir custos. Ao contrário da maioria dos projetos de construção em que projetistas, contratados e responsáveis não compartilham dados, a Black & Veatch está trabalhando em estreita colaboração com os principais envolvidos “para tornar os dados compartilháveis e reutilizáveis em cada estágio da cadeia de valores do projeto, do planejamento e design à estimativa, aquisições, construção, segurança e garantia de qualidade”, diz Michael Etheridge. A Black & Veatch faz o projeto usando o Autodesk Revit, Dynamo e Forge, facilitando a troca de dados entre o modelo BIM e outros aplicativos.
Michael Etheridge diz que o Autodesk BIM 360 e o Forge permitem uma melhor integração e ajudam a equipe a aproveitar melhor os dados, inclusive compartilhá-los com partes interessadas externas. “Imagine que especifiquemos uma bomba”, diz ele. “Antes, forneceríamos informações suficientes para que o contratado pudesse comprá-la. O contratado solicitaria ao fornecedor informações sobre como instalar e ligar a bomba. Então, o responsável solicitaria informações sobre manutenção preventiva ou preditiva e carregaria manualmente esses dados no sistema de manutenção computadorizado para monitorar os requisitos de manutenção e emitir ordens de serviço. Hoje, extraímos dados do fornecedor conforme projetamos a bomba e os repassamos para o contratado e o responsável. O produto final é um modelo BIM que inclui a representação física e os dados para uso na manutenção, eliminando a entrada manual de dados.”
Usando o ASSET360, a Black & Veatch também pode combinar dados de projeto com sistemas de controle de estações e dados de sensores da Internet das Coisas (IoT) a fim de complementar a manutenção preventiva do fornecedor com análise preditiva. “Talvez o manual diga que uma bomba não precisa ser substituída, mas a vibração ou o calor pode sugerir que ela precisa de manutenção mais cedo para evitar uma falha onerosa”, diz Michael Etheridge. “Os dados ajudam a otimizar recursos de operações e manutenção, diminuindo o tempo gasto pelos operadores em tarefas comuns ou prolongando a vida útil de equipamentos pela manutenção orientada por dados.”
Segurança, sustentabilidade e economia
À medida que as estações de tratamento de água se tornam cada vez mais digitalizadas, aumenta a preocupação com a segurança cibernética. A menos que os sistemas estejam protegidos de maneira adequada, existe a possibilidade de hackers causarem problemas, por exemplo, assumindo o controle das unidades e mudando configurações que afetam a qualidade e a segurança da água. Michael Etheridge sugere que as estações de tratamento de água incluam proteções de segurança cibernética nas especificações ao construir ou atualizar unidades, segreguem dados voltados a processos em uma rede privada, ofereçam treinamento à equipe sobre ameaças e melhores práticas e realizem auditorias de segurança continuamente.
É improvável, porém, que potenciais ameaças à segurança interrompam o fluxo de gestão digital da água. A Black & Veatch prevê um número crescente de aplicações da gestão digital da água ao longo de toda a sua cadeia de valores. As estações podem melhorar a sustentabilidade ambiental, transformando resíduos em energia. Os sólidos sedimentados a partir do esgoto podem ser tratados para decomposição e produção de gás metano. Esse gás pode alimentar geradores que produzem energia elétrica, que pode ser revendida à rede ou usada para abastecer a estação. “Os dados podem otimizar a produção de energia e ajudar os operadores da estação a entenderem a melhor forma de usar a energia”, diz Michael Etheridge.
Os municípios também podem combinar dados da IoT com dados sobre a população para decidir quais projetos de capital oferecem o melhor retorno ou para se comunicarem com os consumidores em tempo real sobre a disponibilidade e qualidade da água. “Melhor integração de dados significa mais visibilidade, otimização de operações e disponibilidade de dados para respaldar isso”, diz Michael Etheridge. “E quando fazemos alterações, podemos observar economia e o verdadeiro retorno do custo-benefício.”